sexta-feira, 3 de agosto de 2012


 
 
Como realizar a crítica de uma literatura destinada a tão jovens leitores cheios de subjetividade e que são capazes de facilmente se transportar para universos tão complexos e cheios de fantasias?
Se o debate dessa questão se estende há tanto tempo, é interessante pensar como uma das mais importantes autoras brasileiras de livros infantis percebia a questão. Cecília Meireles em seu texto “Problemas da literatura infantil” publicado em 1979 pela editora Summus, destaca a literatura oral enquanto um registro folclórico que perdura por séculos, responsável por levar histórias aos iletrados, precedendo assim ao alfabeto: “vasta herança literária transmitida dos tempos mais remotos, de memória em memória e de boca em boca”.
Contos clássicos são cheios de elementos tradicionais – e por isso se tornaram clássicos – bruxas, reinos encantados, dragões, fadas, príncipes e princesas, castelos, entre outros. Essa magia vaga no imaginário das pessoas ao redor do mundo, provavelmente desde a infância, remetendo muitas vezes a uma série de ensinamentos e elementos moralizantes. “Vagarosamente elaborada, pela contribuição de todos, essa literatura, possui todas as qualidades necessárias à formação humana. Por isso, não admira que tenham tentado fixá-la por escrito, e que, sem narradores que a apliquem no momento oportuno, para maior proveito do exemplo, a criança se incline com ávida curiosidade para o livro, onde esses ensinamentos perduram”.
Cecília Meireles tendo como premissa a complexidade da infância, “reino que o homem começa a desconhecer desde que o começa a abandonar”, levantada uma questão: como um adulto conseguiria se comunicar com a criança através do livro escrito: haveria uma parcela de criança no adulto para se comunicar ainda com esse universo, e haveria uma parcela adulta na criança para aceitar, e até mesmo gostar daquilo que lhe é oferecido? Cecília Meireles nos diz que a crítica deve ser submetida ao uso da criança, “mais acertado parece submetê-lo ao uso – não estou dizendo a crítica – da criança, que, afinal, sendo a pessoa diretamente interessada por essa leitura, manifestará pela sua preferência, se ela a satisfaz ou não”. Assim, Cecília Meireles afirma que a literatura infantil só existe “a posteriori”, somente depois da delimitação da criança, depois do que foi lido por elas com “utilidade e prazer”. A leitura com utilidade compreende, por sua vez, obras de qualidade literária que problematizam questões do universo infanto juvenil explorando as complexidades particulares – tanto as perdas quanto os ganhos do universo infantil – e ainda, respeitando e compreendendo o modo de perceber o mundo da criança, sendo assim um trabalho com compromisso ético.

Enriqueta leria também adora teoria : )

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